sexta-feira, 28 de agosto de 2009

O início do fim…


“Estamos no início do fim da crise” disse o senhor no alto da sua sapiência, convencido que a frase pegava. E pegou, porque o raio da frase não me deixa em paz, como também não me sai da cabeça a afirmação que se lhe seguiu “mas a crise está longe de ser resolvida!”…???. Passei grande parte das férias a analisar estas duas pérolas desconcertantes da inspiração vocal do Primeiro-Ministro, sem chegar a grandes conclusões. O “início do fim” é um conceito verdadeiramente anti-natura. É o mesmo que dizer “o calor do frio” , “a vertigem do baixo” , “a palidez do moreno” , “o egoísmo do altruísta” ou “a coragem do cobarde”. O fim está numa ponta e o início na outra. Para mais o fim não tem nenhum início. O fim é o fim e pronto. Corresponde ao momento em que alguma coisa acaba; não se prolonga no tempo, nem tem percursos intermédios. Assim como o início é outro momento bem definido. Numa corrida de 100 metros o início é dado pelo tiro de partida e é o início da corrida, não do… fim. O fim é a linha de chegada, é o momento de esticar o pescoço, de levantar os braços, de gritar ufa. Entre o inicio e o fim existe um percurso doloroso a percorrer. Daí eu não perceber muito bem a forma satisfeita como homem disse aquilo. Tenho de confessar que numa primeira análise senti um certo alívio porque me fixei na parte final da frase “…o fim da crise”. Mas quando ele disse que a crise estava longe de ser resolvida percebi que ali havia marosca. Dizer a um maratonista que aquilo é o início do fim da corrida, mas que ainda faltam 42 quilómetros, é de um sadismo a toda a prova. Como também não será de bom tom visitar uma mãe na maternidade e dizer para o recém-nascido, entre bilu-bilus e caretas parvas, que aquela coisinha fofa, está no inicio do fim da vida. Não se faz…Então porque é que o Primeiro- Ministro o faz? Porque não tinha mais nada que fazer. Estava enfadado, ou então enredado pela perspectiva de uma provável derrota eleitoral e lançou esse petardo sinalizador a ver se a coisa pegava. A minha grande dúvida será saber onde está o fim da coisa, se é que a coisa tem fim. Quanto tempo demorará o início a terminar num fim. Das poucas acções onde o tempo entre o inicio e o fim é quase imperceptível será o que dura a explosão de uma bomba num qualquer bairro de Bagdat. Mas longe de mim querer estabelecer analogias entre a cintura cheia de explosivos de um radical islâmico ou o elaborado jogo de cintura utilizado por alguns políticos para dinamitar a clarividência da malta. Teria sido mais agradável ouvir o “fim” sem o “início”. Porque o inicio da crise já eu o senti há muito tempo, mas curiosamente quando isolo a palavra “crise” a única cara de que me lembro é a do próprio senhor que inventou o “inicio do fim…”. O que eu gostaria mesmo era de ouvir que tínhamos chegado ao fim da insegurança, da corrupção, da impunidade, do facilitismo, do trabalho precário, do desrespeito, da pouca vergonha. Dizerem-me que estamos no início do fim do pesadelo é como dizer a um forcado antes da pega que já está no início do fim…da cornada. Não alivia, agrava a ansiedade. Pensando melhor, tenho de admitir que a frase até pode ter o seu quê de positivismo. Eu por exemplo, já não penso no início do trabalho, nem no fim das férias como algo desagradável. Penso que já estou no “início do fim do ano lectivo” e fico logo bem disposto. É preciso é que não apareça nenhum senhor a dizer com um sorriso iluminado “ Chegaste ao inicio do fim, mas tens de ver que o calendário é um pouco…extenso”