terça-feira, 31 de agosto de 2010

A crise da meia-idade

Imagem retirada da net


Estava aqui a pensar na crise da meia-idade que ataca o homem numa determinada altura da sua vida, levando-o a sair de casa à procura de tabaco e encontrar amantes 20 anos mais novas do que ele. O macho começa a temer pelas suas reservas de testosterona e decide desbaratá-las antes que seja tarde de mais. É altura para mandar tudo às malvas e enfiar-se na discoteca até às tantas, percorrer todas as estâncias de Ski dos Alpes, viajar pelas praias do Brasil mais movimentadas. À primeira vista, um tipo fica baralhado com a classificação de “crise”…(?). Numa crise vulgar, um tipo desce sempre para um patamar inferior: na crise financeira um tipo perde dinheiro; na crise da vesícula um tipo tem umas dores do catano; na crise empresarial um individuo perde o seu emprego; na crise da meia-idade um homem ganha o que sonhava ter com 20 anos : uma mulher de 25 e uma conta bancária de 50. Já ouvi alguém dizer que em linguagem informática representa uma espécie de up-grade; uma troca entre o velho e gasto sistema operativo por um sistema cheio de virtudes e energia renovada. Não sei bem aos quantos anos aparece a meia-idade. Fala-se dos 50, mas isso são os inebriados optimistas que esperam chegar aos 100 a comer todos os dias carradas de emulsionantes, conservantes e pesticidas. Basicamente, corresponde à idade em que o homem se perde na comparação das coxas com celulite e as mamas descaídas da mulher que tem em casa, com as coxas firmes e os bustos espetados das jovens que passam na rua. Aquilo é de mais para o seu sistema hormonal, apesar de arranjar justificações no desgaste emocional do casamento, na falta de diálogo, nas rotinas diárias, nas pulgas dos cães, na educação dos filhos. O que o cinquentão quer mesmo, é pôr as mãos noutra mulher que não a sua. Existem mesmo indivíduos que prolongam a crise da meia –idade, até à idade geriátrica. Estava a folhear uma revista e olhei para a imagem de um tipo com 75 anos agarrado a uma mulher de 20. Quando diziam que não se tratava de avô e neta, a imagem incomodou-me. “Mas incomodou-te porquê?” perguntarão alguns. “O tipo é que a sabe toda! A mulher tem tudo no sítio. Já viste bem aquele par de pernas?” . As pernas de facto não eram desprezíveis, a minha dúvida é o que pensará uma mulher com umas pernas daquelas, entrelaçadas num avô daqueles?”. Depois de uma primeira análise à luz do pensamento masculino do “Estes gajos é que são espertos”, penso um pouco melhor e chego à conclusão de que não é inteligente um tipo querer retroceder a uma idade pela qual já passou há muitos anos, quando já não se tem idade para isso. Consciente dos atributos de uma mulher com os mamilos a apontar fulminantes para as nossas retinas, continuo a preferir o invólucro usado da minha mulher. Eu sei que não é muito lógico, mas com a celulite nas pernas, também ela tem a memória dos tempos em que eu tinha os meus vigorosos vinte anos. Ela ainda me atura, ainda suporta o mau hálito matinal, a rabugice nocturna, as bufas malcheirosas, as meias desarrumadas, as adiposidades abdominais, porque ainda se lembra de mim dos tempos em que eu encantaria qualquer mulher de 50 anos com crise de meia-idade. Uma miúda que se deixa caçar por um velhote, conhecê-lo-á sempre com mau hálito matinal, com artroses nos joelhos, com pêlos nas orelhas, com a prótese dentária a boiar no copo da mesa de cabeceira. Nunca poderá dizer: “Lembras-te daquele mortal com pirueta que deste para dentro da piscina, antes de me atacares debaixo de água?”. Mas as mulheres mais jovens têm o pêlo na venta, não têm enxaquecas na hora H, não é necessário um tipo humilhar-se para conseguir dar azo em pleno à sua testosterona. Mas como é que um tipo consegue libertar o seu tigre assanhado sabendo que aquela miúda poderia ser sua filha? Para além desta sensação de pedofilia incestuosa implícita, também é a partir dos 50 anos que um homem começa a ir aos médicos. E quem é que o acompanha às consultas de urologia; a quem é que se queixa da crise hemorroidal; quem é que lhe lembra da toma do remédio para a tensão? O encantamento da jovem conquista diluir-se-ia à primeira pedra na vesícula, a não ser que conseguíssemos pagar o seu tratamento psicológico nos shoppings das redondezas.
Não sei se cheguei já à meia-idade e se a crise da mamoca arrebitada está para se abater sobre a minha retina. De qualquer maneira estou na defensiva até porque sou um tipo curioso e gostaria de saber como eu e a minha mulher nos conseguiremos suportar durante mais uns anitos com a sanidade intacta. Existirão momentos em que talvez possa ser necessário recorrer a alguns truques da juventude. Hoje fui à prancha exibir o meu mortal com pirueta. Caí um pouco torto e acabei no centro de saúde a levar um anti-inflamatório nas nalgas. Quem me segurou na mãozinha?.... Ninguém. Qu' é para a próxima não te armares em puto de 20 anos...

O Bandido "Estrela "


Deu-se finalmente a viragem que todos ansiávamos na dinâmica da criminalidade. Até aqui, alguns de nós tinham alguma dificuldade em aceitar a impunidade dos actos criminosos. Tínhamos a exótica ideia de que se um tipo rouba, incendeia, espanca ou mata, deveria ir para a choldra. Nada mais errado. Começam a circular histórias comovedoras da outra faceta da bandidagem que nos faz mudar de opinião. O enternecedor relato do menino que com os primos pegou fogo a uma mata só para ver os helicópteros da televisão a chegar. A avó da criança dizia que “são crianças inocentes que devemos perdoar e ensinar melhor…”. E lá estava a fotografia do miúdo num jornal diário, exibindo o isqueiro com que mandou fogo aos pinheiros, como se posasse para uma revista da especialidade “Fogos nas Coutadas”. O cachopo não estava era à espera que, com os bombeiros e os helicópteros de televisão, também viriam os repórteres do jornal à sua procura. Ao invés de uns dias de trabalho comunitário, viria um dia de intensa entrevista para que contasse a todos a sua habilidade de mandar fogo aos hectares de pinhal. Eis que aparece novamente o “emplastro” destes cenários, o Psicólogo criminal a defender que “melhor do que reprimir há que educar”. E viva a educação sem repressão! Vamos ouvir mais um bocadinho o psicólogo… “há que educar para a cidadania…explicar que um simples fósforo pode destruir casa e florestas…” algo que uma criança de 11 anos desconhecia de todo; consta-se mesmo que confundiu o fósforo com um violino e que se preparava para produzir uma melodia musical. Não podes mandar fogo ao pinhal, menino. Tens de saber que não é uma atitude correcta… “E atão com’é ca gente chama cá os helicótros???”. A fotografia no jornal é que já ninguém lha tira, até porque representa um registo fidedigno da sua heróica acção que pode mostrar orgulhosamente aos amigos ou colar na parede do quarto junto ao poster do Simão Sabrosa.
Num outro jornal diário, a descrição das aventuras dos carteiristas de Lisboa. Estão identificados 1010 gatunos, que todos os dias ganham a vida a meter as mãos nos bolsos dos turistas. Os heróis têm nomes sugestivos como “Zé do Porto”, “Aníbal dos transportes”, “Cara de Cão” ou “Treinador”. Quase todos já foram apanhados com a mão na botija, mas são sempre soltos porque não conseguem gamar mais do que cem euros de cada vez. Os turistas estão cada vez mais unhas de fome… O conhecido “Zé do Porto” rouba com o filho, a mulher, o primo e o neto(?). Uma empresa familiar de Carteirismo, Lda. Nos 20 anos de “profissão” e, depois de inúmeras detenções, só teve prisão efectiva uma única vez. Depois de ler o relato da vida destes simpáticos carteiristas, com particular ênfase para “O Barrigas” um velhinho de 70 anos que reparte a sua actividade entre o gamanço da carteira alheia e o furto em lojas de Lisboa, sinto que a minha revolta anti-impunidade está a sofrer transformações. A partir de agora podemos dar azo à sensação “Ocean’s Eleven” que temos dentro de nós. A ideia de que uma quadrilha que rouba bancos e casinos pode ser admirada se a história for contada com algum nível e embelezada com actores como Brad Pitt, Julia Roberts ou George Clooney. Tudo depende da forma como a história é contada. Só é necessário transformar o acontecimento numa história. O acontecimento: “Um idoso tem o dinheiro da reforma na carteira que é roubada por um gatuno na fila do autocarro”. A história do acontecimento é contada: “A habilidade de “Johnny das carteiras” conseguiu subtrair de forma imperceptível todo o dinheiro que um palerma tinha no bolso detrás das calças. Depois desta imaculada abordagem, Johnny consegue embrenhar-se na multidão e fugir como uma astuta raposa.”. São as virtudes do desenvolvimento: Passou-se da imagem do criminoso malandro para a do habilidoso malandro. Aproveitando este embelezamento mediático da bandidagem, já está a ser planeada a rodagem da produção cinematográfica caseira “Porto’s Eleven” que retrata as agruras emocionantes da família “ Zé do Porto”, vividas entre o eléctrico 28, o elevador da Glória e o Rossio. Ainda não conseguiram arranjar todos os protagonistas para completar o elenco de onze bandidos, no entanto, no caso dos sobrinhos do Zé se mostrarem indisponíveis, sempre têm mais 1005 candidatos em lista de espera.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Play Station 2


Centena e meia de reclusos da cadeia de Sintra fizeram greve ao almoço como forma de protesto contra a fraca qualidade da comida, mas sobretudo por não poderem utilizar a playstation 2 (?). Claro que a greve apenas durou uma refeiçãozita porque a larica é muita e a paparoca por muito má que seja, não pode ser desperdiçada longe de corpinhos tão desgastados de tanto trabalho que realizam. Ainda houve um deles que gritou “Vamos fazer como aquele gajo cubano, o Guilhermo Fariñas, e só paramos a greve de fome, quando nos meterem no prato uns bifes de lombo!” . Apanhou logo uma “belinha” no toutiço acompanhada da reprimenda “Cala-te ó palerma que a greve de fome custa comó caneco; fazemos um rápido alarido só para nos fazerem a vontade! ”. Saiu o tal comunicado da indignação por não se poderem divertir aos comandos da Playstation, mas que ficasse claro aquilo não era uma greve de fome, …era só um protesto…zito. A reivindicação é justa. Num país onde apenas muito poucos bandidos conseguem chegar às cadeias, o prémio para tal selecção deveria incluir no mínimo uma jogatana com o FIFA 2009. Senão com que é que a malta passa o tempo? A ver televisão? A traficar heroína? A molestar outros presos? A fazer musculação para arrear nos guardas? Mas esta questão não é inocente; é necessário ler nas entrelinhas. As prisões em Portugal não passam de enormes playstations, que traduzidas para a língua de Camões significam “Estações de Reinação”. Quando gatunos condenados têm margem para exigir brincadeiras virtuais como passatempo, porque não ocupam o tempo com trabalho comunitário, ou estão a brincar com toda a malta que roubaram e assassinaram, ou então já perceberam que a punição que sofreram, é assim uma espécie de chicotada dada pelo palhaço “Choné” com folhas de papel celofane colorido. Aliás, o facto de pedirem a playstation 2 para as cadeias é sintomático. A Play Station 1 , já tinha sido solicitada para munir os tribunais, pois é aí que começa toda a brincadeira. Os duelos entre argumentos esgrimidos pelo Ministério Público e recursos disparados por advogados de defesa da bandidagem como quem lava os dentes, passando pelas liberdades condicionais oferecidas a gatunos por divertidos juízes, representa o que de melhor poderá oferecer um qualquer salão de jogos. A notícia de que morre em Portugal uma mulher por semana vítima de violência doméstica, perpetuada por indivíduos anteriormente identificados como agressores, é um exemplo deste “playground” judicial. A jogatana começa com a permissa “Vamos lá libertar este tipo e apostar em quanto tempo consegue voltar a deitar as mãos à mulher”. Na maioria dos casos ganha o jogo quem vaticinou que a vítima seria esfaqueada ao fim de 5 dias. Mas a riqueza da playstation é que se poderão introduzir na consola, vários tipos de jogos com diferentes variáveis. Assim poder-se-á apostar só no tipo de morte (quem apostar à “paulada” tem um bónus extra na pontuação) ou no tipo de personagens (Bandidos do carjacking; assaltantes de ourivesarias; agressores de polícias). Na berra está o jogo “Romenos em fuga 2010”. A acção consiste em libertar 2 romenos que espancaram um senhor velhinho para lhe roubarem o carro, e depois segui-los para ver em quanto tempo conseguem fugir para o lado de lá da fronteira. Este jogo tem uma nova aplicação que representa o percurso inverso dos gatunos, ou seja, depois terem fugido do país, serão acompanhados uns dias depois, no seu retorno a Portugal, para voltar a gamar outro carro e mandar mais umas traulitadas na cabeça de outra vítima.
Parece que já existe a PlayStation 3 cuja virtude é a de poder ser jogada com comandos sem fios, ou seja, o jogador pode estar a jogar sem ficar emaranhado nos fios e fingir que nem está ligado ao ecrã. Esse tipo de consola tem sido utilizada nas mais altas esferas políticas e empresariais e nem mesmo algumas “escutas”, conseguem emaranhar esses hábeis jogadores.
Já me esquecia dos reclusos da cadeia de Sintra. Adivinham o que lhes terá acontecido? Qualquer director com bom senso e sentido de gestão financeira, estimulava mais protestos de greve às refeições como forma de poupar uns cobres valentes na alimentação dos latagões. Na verdade, os presos conseguiram ser transferidos para outros estabelecimentos prisionais, provavelmente munidos com salas de playstation onde se podem divertir à bruta. A esta hora estará o dissidente cubano Fariñas a contorcer-se de inveja, porque em Portugal, não teria tido necessidade de passar tanta fomeca, para conseguir a libertação dos companheiros.
Neste momento, escondo o recorte de jornal com a notícia dos presos da “PlayStation”, com receio que os meus filhos vejam. Há já algum tempo que me andam a pedir o raio da consola e correria o risco de algum deles me perguntar “Ó pai, será preciso eu ir para a cadeia para conseguir jogar o FIFA 2009?”. Para a cadeia talvez não, mas com o apetite que têm e ao preço a que estão os víveres, bem poderiam avançar com um protesto em forma de jejum…