domingo, 29 de maio de 2011

A Antropologia da “Pintelhice”

Estava a ver as sondagens e achei estranho que o “engenheiro” se mantivesse ali taco a taco na frente do pelotão eleitoral. Por momentos veio-me à memória a discussão sobre a despenalização das drogas leves, isto porque apenas acredito que um tipo consiga colocar, de forma voluntária, a cruzinha no partido do homem, debaixo do efeito inebriante duma dose considerável de maconha no cérebro. Dei voltas a todas explicações racionais, que levam um indivíduo a gritar “Força Sócrates és o maior” sem uma Kalasnikov apontada às têmporas e cheguei à teoria do “pentelho”. Eu sei que muita gente ficou horrorizada com o pentelho libertado pela boca do economista aspirante a ministro das finanças. Como é possível uma figura pública ousar dizer “pentelho”?... pensarão os mais puritanos. Mas o tipo, limitou-se a usar um termo bem português, que coloca o pentelho no seu devido e insignificante lugar, ou seja, no meio de milhares de outros pentelhos. É isto que verdadeiro pentelho representa; um pêlo púbico perdido incógnito numa floresta repleta dos seus semelhantes. Eu próprio nutro um certo sentimento de compaixão pelo pobre do pentelho, que se encontra enclausurado todo o dia debaixo de umas cuecas, sonhando com uma súbita exposição solar na praia do Meco ou na casa de férias da Shakira. Catroga conseguiu libertar o pentelho do anonimato, quando disse “em vez de se discutirem as grandes questões do país, andam-se a discutir,…pintelhos…” . Conseguiu transformar o pentelho num facto de enorme relevância. Deu-se enorme importância aos pentelhos de Catroga quando se deveria dar importância à capacidade generalizada de se ter conseguido transformar factos importantes em pintelhices. A pintelhice não será mais do que a acção produzida pelo pentelho, ou seja, uma comichão quase imperceptível. De facto, muitos portugueses vêem a sua racionalidade assaltada, quando conseguem colocar a cruzinha no homem que os levou à bancarrota. Bancarrota?...isso são pintelhices. O primeiro ministro mente com alguma frequência quando fala do que vai fazer por Portugal?... pintelhices. Uma Juíza foi apanhada em contramão com taxa de alcoolemia de 3,08 e é libertada porque os polícias não a podem prender em flagrante delito, porque um magistrado só pode ser detido em delitos que levem a penas superiores a 3 anos…?....pintelhices. Alunas espancam de forma pré-histórica uma colega, puxando-a pelos cabelos, pontapeando a sua cabeça e gravando a acção como uma cena de cinema, são postas em prisão preventiva e o iluminado e defensor das minorias Marinho Pinto, vem dizer que a medida é exagerada, ou seja, que aqueles biqueiros são,… como haveremos de dizer,…pintelhices. E é, esta a capacidade selectiva e aguda do “portuga” para transformar um facto aparentemente grave numa insignificante pintelhice , que o leva a viver sem lhe pesar muito a consciência. E a derrota do Benfica contra o Braga?...Epá, isso é de um gajo ficar doido!!!...
Continuo com alguma dificuldade em digerir que Sócrates, depois de toda a borrada que conseguiu produzir, apresente nas sondagens, uma percentagem acima dos 0,02%. Em qualquer país com um índice intelectual decente, com população pouco inebriada com pseudo-pintelhices o tipo seria mandado para o Botswana num barquinho a remos pneumático. Por cá , os comícios e arruadas estão cheios de apoiantes…Shiuuu,…parece que muitos deles são imigrantes do Paquistão e Guiné-Bissau que vieram em autocarros pagos pelo partido, para mandar os dentes à sandocha de fiambre, ao Sumol de ananás e ainda receberam uns bonés à borla. Vendo bem as coisas, apesar de não perceberem patavina de português e de não poderem votar, são os apoiantes mais adequados para Sócrates, uma vez que com esta governação nunca o país esteve tão próximo dos índices de desenvolvimento do Paquistão e da Guiné-Bissau. Mas isso…são pintelhices…
Espero que os portugueses acordem rápido deste estado de letargia e que dêem finalmente ao pentelho o protagonismo que este merece. E no caso de nunca reparar na importância do pobre pentelho? Aí, teremos de esperar pela chegada de uma epidemia de chatos, de nome científico piolho-do-púbis para, de uma vez por todas, os obrigar a coçar vigorosamente onde as pintelhices fazem das suas…

terça-feira, 12 de abril de 2011

O ângulo da Ruína



Era com expectativa que todos os portugueses esperavam pela declaração do tipo a assumir finalmente que teria de pedir ajuda ao FMI, aquela espécie de doença venérea que, uns dias antes, garantia que jamais viria assolar a nossa esplendorosa saúde financeira. Estávamos todos ansiosos para saber como o homem, mais uma vez, conseguiria descalçar essa botifarra do paraíso virtual que nos andou a calçar desde que aqui chegou.
À hora marcada a televisão faz um directo ao palácio de São Bento e lá está o tipo,…sem o casaco vestido…?...Nem parece dele. O homem dos fatos Armani, surge em camisa branca…? Percebemos que ele ainda estava a ensaiar o discurso; a televisão transmitiu cedo demais. Seria a oportunidade de sabermos a agonia real que o Primeiro Ministro, estaria a sentir por ser forçado a contar a verdade aos portugueses. Antecipamos de forma imaginária o que o preocuparia durante o ensaio: “Quais as palavras mais correctas para assumir de forma frontal a minha genuína incompetência…”. No entanto somos surpreendidos por um “Óh Luís, vê lá como é que ficou a olhar p’rós…” e prossegue “…Assim fica melhor? …ou fica melhor assim ?” . O pivot regressa atrapalhado ao estúdio dizendo que entraram cedo demais. Desta vez fiquei mesmo impressionado com o nível do Primeiro Ministro. É preciso um homem ter ,…(não, não é falta de vergonha), …um enorme sangue frio, para numa altura em que deveria estar a suar convulsivamente, a tremer das mãos de forma descontrolada, com enorme vontade de correr para a casa de banho, com a voz seca de tanto nervosismo, brindar-nos com a sua grande preocupação “Oh Luís assim fica melhor? Ou fica melhor assim?”. Não valia perder tempo com os seus inigualáveis feitos governamentais tais como a capacidade de ter conseguido levar o país à porta da bancarrota. Era tempo sim de passar à análise do melhor ângulo para falar aos portugueses. Ao menos o tipo vai assumir de uma vez por todas que fez asneira da grossa! Ficamos admirados, quando, já de fato vestido, com o seu melhor ângulo e a sua melhor expressão de crise, anuncia que a tal doença venérea veio pela mão irresponsável do outro que não tem um ângulo assim tão bom. Quando se pensava que ele finalmente diria : “Peço desculpa aos portugueses por ter sido o Primeiro Ministro com maior descaramento que alguma vez passou pelo Palácio de S. Bento” ele, com enorme… descaramento e o seu melhor ângulo, consegue continuar na senda do recorde de resistência difícil de igualar do “Homem que consegue manter o seu melhor ângulo durante mais de 6 anos”. Eu acho que o tipo teria feito uma carreira imaculada num qualquer estúdio de cinema, tal o seu perfeccionismo para pormenores fundamentais dessa vida de estrelato. Consegue encarnar o papel de político competente,.. perdão,.. extremamente competente, com um grau de realismo de fazer inveja ao actor Anthony Hopkins, Eu acho bem que um tipo se preocupe em manter a compostura na hora do pesadelo. O País está de pantanas mas o tipo pergunta qual a expressão que fica melhor para a câmara número 2. É a ruína no seu melhor ângulo. Ou será que o seu melhor ângulo continuará a encobrir a ruína?...
A ruína pode ser materializada na imagem desoladora de um navio a afundar. Os marinheiros vêem a água inundar célere o convés e olham em desespero para o comandante com a pergunta desesperada fugindo-lhes entre os dentes: “E agora capitão, o que fazemos???”. O Comandante encosta uma mão sobre o leme, com a outra acaricia o cabelo e, com o olhar sobre o ombro pergunta, “Oh Luís, assim fica melhor?...ou fica melhor assim?...”

domingo, 13 de março de 2011

A Pachorra para ler…

Uma colega de Português pediu-me que escrevesse umas palavras sobre a importância da leitura na vida dos nossos alunos. Teve tanta pontaria que escolheu, provavelmente, a pessoa que menos livros leu durante a juventude. É como pedir a um vegetariano que dê a sua opinião sobre a qualidade e textura do bife da vazia. Não sei se os livros do Asterix podem ser incluídos na prateleira da leitura; daquela leitura de que toda a gente pensa quando fala em… leitura(?); os livros com muitas letras e poucos bonecos. Se os bonecos estiverem incluídos no clube da literatura, já me sinto entre o vegetariano e o talhante. É que na infância devorei muito murraça do Obelix dada aos seus amigos romanos, tive pena do que faziam ao incompreendido e afinado Bardo Cacofonix, invejei o efeito da poção mágica do Druida Panoramix (o jeito que me tinha dado nas lutas lá no bairro com os matulões que nos roubavam os berlindes). A razão de não ter lido muita literatura durante a juventude deveu-se sobretudo à falta de…Pachorra…(?). “Falta de Pachorra” significa basicamente o mesmo do que “Falta de Paciência”, mas soa com uma rudeza mais próxima daquela que a maioria dos jovens sente quando pensa em livros com 258 páginas cheias de pronomes e substantivos. Geralmente, a falta de pachorra é acompanhada por uma expressão facial de quem comeu solha frita importada da Tunísia. Mas a falta de pachorra não aparece apenas durante o estudo dos livros de Sophia de Mello Breyner ou a análise de um texto de Almeida Garret. Ela surge quando a mãe manda arrumar o quarto, sempre que se tem de levantar a loiça suja da mesa, resolver problemas intrincados da Matemática, mudar o rolo de papel higiénico que chegou ao fim, fazer conversa com as tias afastadas durante um encontro familiar, ou estar sentado e atento a uma aula de 90 minutos sobre o processo de fotossíntese nas plantas. A “Falta de Pachorra” é, no entanto, selectiva. Sobressai de forma mais intensa em algumas actividades. A “Falta de Pachorra” é atenuada durante uma jogatana de futebol com os amigos, o envio de 50 SMS por minuto à namorada, o acto de enfardar Menus no MacDonald’s, um confronto de Play Station pela noite dentro, o visionamento do episódio 3859 dos Morangos com Açúcar, a criação de galinhas virtuais no Farmville . Nestes casos a “Falta de Pachorra” transforma-se, como por milagre, em “Falta de Tempo” . Como os miúdos gostariam de ter mais tempo para fazer tudo o que não lhes suscita a repulsa associada à falta de pachorra!!! Na verdade, a falta de pachorra tem uma relação estreita com o conceito de Tempo. A escassez de pachorra acontece porque se acha que o tempo escasseia. Tem de se fazer tudo a abrir, a correr, a “spidar”, uma vez que nas células do jovem imberbe existe a ilusão de que todas as coisas boas são aquelas que se vão fazer a seguir. É uma espécie de síndrome de banquete nupcial. “Deixa-me meter rápido os dentes no rissol de camarão, porque ali ao fundo da mesa estão as coxas de frango quase a acabar!”. O rissol é sugado, a coxa de frango triturada, a salada russa aspirada, para se poder encher a tigela de mousse, pudim de ovos e abacaxi, para ainda ter tempo de comer uns ovos moles de Aveiro antes do café. A velocidade com que os mercenários perseguem terroristas nos jogos das consolas PS3 é reveladora da capacidade meteórica dos jovens para processar informação. Reagir a muitos estímulos num curto espaço de tempo. É por isso que a malta jovem não tem pachorra para ler livros com muitas frases e sem bonecos. Essa leitura implica prescindir do seu precioso tempo que passa a abrir. A inquietude inibe a pachorra. Para se ler é preciso sentar e estar-se ali sem pressa de matar terroristas ou fugir de bolas de fogo arremessadas por monstros. O livro é para se ir lendo enquanto se bebe um chá de camomila; a história é para ser ir descobrindo de forma progressiva. “Então e o final? Nunca mais chega? O tipo sempre fica com a miúda gira?...Chá de camomila?...Eu quero é Red Bull para ganhar asas e voar até à última página que nem um tiro!” .
Também eu na juventude perdi tempo em busca do tempo que poderia perder. Também me faltou pachorra para trocar as aliciantes peladas de futebol por enfadonhos livros cheios de substantivos e pronomes. Descobri a leitura mais tarde. Comecei a ganhar pachorra, ou antes, paciência, no dia em a minha inquietude foi agarrada pelas letras de um livro. Deixei-me viajar pela história adentro sem pressa de acabar, mas com pressa para chegar ao enredo da página seguinte. Descobri que as palavras, quando bem escritas, valem mais do que mil imagens. Conseguem elas próprias criar 5000 imagens que nos rasteiram a pressa, nos alfinetam a curiosidade, nos espicaçam o humor, nos estimulam o raciocínio. Mas para que essa descoberta da leitura se dê, é preciso pachorra para esquecer o tempo que perdemos por estar ali a viajar sentados.
Agora digam-me lá, quantos de vocês, que estão a acabar a leitura desta sequência de letras em forma de texto, teriam pachorra para a começar a ler se, não fosse a professora de Português dizer-vos para a trocar por aquele SMS que iriam enviar, com o telemóvel escondido debaixo da mesa, ao vosso amigo? …O que diria a mensagem?... “G’anda seca! Estou sem pachorra para ler esta montanha de substantivos e pronomes, escrita por um tipo que só lia livros com bonecos, na juventude…”

Para quando um Taser de efeito prolongado?

As imagens do presidiário a levar com uma descarga eléctrica no lombo, horrorizou meio país. Coitado do moço, estava de costas para os guardas, e estes, à socapa, mandaram-lhe com um choque que o fez estrebuchar de dor. Isto nem na cadeia de Guantanamo, grandes malandros! Parece que o rapaz apenas se divertia a fazer pinturas rupestres com fezes nas paredes da cela. O que é que queriam? O tipo não tinha guaches, marcadores ou lápis de cera, teve de utilizar o material que estava mais à mão. Depois, ficou revoltado quando os guardas quiseram exterminar a sua obra, com recurso ao Sonasol e decidiu atirar uns pratos aos repressores da sua arte. Pensando bem, até poderia ser a forma que encontrou para fazer alguma actividade física, num exercício de arremesso activo. É que a vida sedentária numa exígua cela, pode ser causadora de obesidade e doenças cardiovasculares. Os guardas começaram a ficar um pouco cansados de tanta actividade…artística, mas sobretudo de levar com tanto prato pela testa e cócó nas narinas, que trataram de resolver o problema pela raiz; o cócó não pode ser arremessado se a produção for interrompida. Então, o grupo de intervenção policial entrou na cela e disparou a pistola Taser, que lança uns eléctrodos que conseguem imobilizar directamente o produtor das fezes. Foi o choque geral com o choque dado ao prisioneiro. Parece que a arma manda umas centenas de volts ao corpanzil da vítima, deixando-a sem reacção. Tenho dificuldade em quantificar a magnitude da voltagem que sinto no corpo sempre que oiço o “Engenheiro” Sócrates dizer, que se não fosse ele, o país estaria como a Líbia, mas sem o petróleo. Também eu sinto um certo desfalecimento e ainda não vi ninguém chocado com os choques que levo todos os dias no dorso, com a agravante de nunca ter espalhado sequer uma dedada de fezes na parede do quarto. Ainda ontem me contorci de dor ao ouvir o presidente do Supremo Tribunal de Justiça insistir na "destruição imediata" das escutas telefónicas do processo Face Oculta que envolvem o primeiro-ministro. Apesar de existirem escutas incriminatórias, há que destruí-las para que o “Engenheiro” nos possa dizer que nos salvou de ser uma nova Líbia, mas sem o petróleo. Ao menos o prisioneiro ainda se pode divertir a arremessar com os pratos ou a caca à cabeça dos agressores. O que me apetecia pegar em pratos sempre que levo eléctrodos lançados pelo sorriso da Ministra da Educação falando nas virtudes do ensino de sucesso em Portugal. Um choque dado pelo disparo do “Taser” não tem o efeito prolongado da azia que nos acompanha desde há alguns anos. Deve ser desconfortável durante uns segundos, mas nos segundos seguintes já se pode voltar a dar largas à veia rupestre. E é nisso que peca o Taser. Bom, bom, seria terem inventado um Taser com efeito de imobilização por tempo (in)determinado. Quantos pais de filhos adolescentes, não desejaram já imobilizar o rebento durante a “idade do armário” e só o reanimar durante a fase adulta? Que aliviador seria, lançar os eléctrodos em direcção aos personagens que nos governam e deixá-los ali, sem acção, até…aparecer alguém competente. Certamente estaríamos a salvo de mais borradas feitas nas paredes do nosso quotidiano. Parece que a medida foi aplicada na Bélgica e descobriu-se que o país funciona melhor com o governo…imobilizado.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

A Guerra...

Eis uma reportagem que ilustra o lado rude da guerra. O Calor, o cheiro da morte, o silêncio interrompido pelo grito do moribundo. Sem efeitos holliwoodescos, ou actores espampanantes, a guerra crua e dura. Por azar o meu pai comandava aquela companhia debaixo de fogo...

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

E Alcanena aqui tão perto…


Há muito que precisava de um bom motivo para deixar de ir à piscina. Todos os ortopedistas, reumatologistas e outros “gistas” do género, aconselham que o acto da submersão faz bem à saúde; que tira as dores nas costas; que as articulações funcionam melhor; que faz bem à depressão; que tira os germens da pele; que combate a osteoporose; que até deixa os dentes mais brancos. Sempre questionei essa teoria, por achar estranho que uma actividade tão chata, possa fazer tão bem. Tentando pôr de lado o cepticismo, continuei a submeter-me, dia após dia, a essa penitência aquática da contagem de azulejo. Finalmente, alguém se lembrou de mim e facultou-me o empurrão que me faltava para me afastar do líquido de uma vez por todas. Fui carregar o cartão das entradas e a senhora do balcão disse-me, um pouco a medo, que agora eu tinha de pagar mais uma taxa de inscrição anual de 9 euros no caso de querer comprar mais do que uma entrada. De princípio fiquei baralhado. Em qualquer loja, quando um tipo quer mais quantidade, tem maior desconto(?). Aqui não. Uma entrada não paga taxa; muitas entradas já pagam taxa. Estava eu a ver se percebia esta mirabolante teoria comercial com um pensamento do tipo “mas,…mas,…mas…” quando a senhora simpática me disse que agora, como era uma empresa municipal uma tal de “Turriespaços” que geria os espaços desportivos, as regras tinham mudado e venha de lá a tal taxa. Aliás, existe coerência nisto; a taxa faz parte do código deontológico de qualquer empresa municipal . Ainda me lembro a cara que fiz e o vernáculo que utilizei quando vi a magnitude de imposto anual que tinha de pagar pela minha casa. Perante a expressão de admiração e alguma azia, a senhora do balcão remeteu-me para o responsável das piscinas e eu lá fui falar com ele, aliás, congratulá-lo porque me tinham mostrado finalmente a luz, a luz do “não, não quero mais disto!”. Explicou-me que aquela taxa, representa um seguro para os utilizadores frequentes e é obrigatória. Descobri que não quero ser utilizador frequente, apesar dos médicos dizerem que um tipo deve utilizar frequentemente a piscina. O pagamento de taxas não pode fazer bem à saúde, principalmente quando a taxa não é sobre coisas agradáveis de se fazer. Uma taxa sobre o arroz de cabidela faria mais algum nexo. Agora, uma taxa sobre algo, já de si, tão penalizador, isso é demais. A partir de agora quero ser apenas frequentador não frequente; ou antes, o menos frequente possível. Agradeço desde já à empresa municipal por ter tornado possível o fim do meu castigo enquanto frequentador assíduo da piscina. Parece que esta é a tal empresa que irá receber da câmara municipal a quantia de 1 milhão e 600 mil euros para fazer face às despesas deste ano. O incremento de um irrisório milhão comparativamente à despesa do ano anterior. Faz todo o nexo, a empresa recebe mais um milhão e pede mais uma taxa ao utilizador. É dinheirinho bem gasto, sim senhor! Tudo o que sirva para evitar que eu tenha de calçar o chinelinho de dedo, enfiar a touca na cabeça e engolir pirulitos, é bem vindo. Chega mesmo a ser consolador saber como a Câmara Municipal estoira o IMI da minha casa, o imposto do meu carro e ainda me consegue pedir mais uma taxa para eu ficar seguro. Seguro de quê? Das taxas surpresa…
Mas agora fiquei lixado, porque me disseram que nas piscinas em Alcanena só cobram 10,54 euros mensais para utilizar o líquido sempre que se quiser. Nem uma taxazita extra por ser utilizador frequente? Nem limite de tempo? Então e os custos de manutenção, do pessoal, do aquecimento da água? Quando acalentava a esperança de largar o líquido de vez, vêm-me estes tipos dizer que eu até posso ser frequentador assíduo. Os 18 euros que pagaria por 10 entradas ou 40 euros por 30 entradas em Torres Novas, mais os 9 euros de taxa é que são valores compatíveis com o abandono por justa causa. Agora 10,54 euros por 30 dias de utilização, isso não se faz….já não tenho desculpa. Não sei o que passa na cabeça dos responsáveis da CM de Alcanena. Essa bizarrice de colocar os espaços desportivos ao serviço da população a preços convidativos. Atendendo às filas intermináveis para se poder utilizar a piscina, dever-se-ia adoptar uma estratégia de selecção, do tipo inventar taxas para segurar qualquer coisa. Esta é a mesma Câmara onde as pessoas podem, vejam bem, utilizar a pista de tartan sempre que quiserem, sem pagar uma taxazita. São os mesmos que criaram, há uns anos, aulas gratuitas de ginástica para idosos. Os tais que não destruíram a piscina de verão, para que a rapaziada continue a escapar, para lá se divertir quando faz calor.
Resignado, entregue ao infortúnio, vou ter de voltar a fazer o saco, com o chinelinho e todo o material necessário à penitência, e rumar contrariado para colocar as ventas no líquido, nas piscinas de Alcanena…

Como espalmar a actualidade

Fui agarrado pela rotina do “Pai que leva a filha ao jogo” trocando o aconchego do travesseiro, pelo traseiro sentado na gélida bancada do pavilhão. Estava eu a fazer de Cheer Leader juntamente com os outros pais, quando chegou o meu amigo João. Cumprimentou-me e pediu-me o jornal. Achei estranho. Quando pensava que me iria dar o seu apoio na claque dos pais empenhados, que comentaria comigo a prestação fabulosa da minha filha a tentar correr atrás da bola, verifiquei que trocou essa tarefa pela leitura do Diário de Notícias…?... Continuei a ver as miúdas a tentar concretizar com algum sucesso a árdua tarefa de colocar a enorme bola dentro do pequenino cesto, fazendo um esforço para não me revoltar com o criador deste desporto quase masoquista, que, para além da abertura quase microscópica do cesto que inventou, ainda o colocou a mais de 3 metros do solo, mesmo para fazer sofrer os pais. Quando terminou o 2º período, olhei em busca das notícias do jornal e nada. O João continuava ao meu lado , mas o jornal tinha sumido. Perguntei-lhe pelo jornal e ele apontou com o indicador na direcção do seu traseiro. Por momentos pensei que ele tinha utilizado as folhas do mesmo, para uma leitura fisiológica, mas, ao ver o bordo da página 37 a sair junto às calças do meu amigo percebi. Ele já tem a graduação superior da licenciatura “Pai que leva os filhos aos jogos”, conseguida por inúmeros campos de futebol arejados do distrito e arredores. A longa experiência adquirida em bancadas gélidas já lhe forneceu mecanismos de defesa para o não enregelamento dos glúteos. É certo que as folhas espalmadas do meu Diário de Notícias pediam clemência, mas a bunda do João, essa, estava mais quentinha do que a minha. Quando me viu a olhar para o meu pobre jornal com uma expressão de admiração, riu-se e perguntou-me se não conhecia a técnica. Não conhecia, mas fiquei a conhecer e “Agora passa para cá as páginas do desporto, que eu também quero a bunda quentinha!”. Ainda pedi mais páginas para o outro pai que tiritava ao meu lado, que se contentou com a secção dos classificados. Estávamos ali os três sentadinhos em cima das folhas do jornal e, por momentos, dispersei a minha atenção do jogo, para as notícias espalmadas entre o traseiro e a bancada. Na realidade eu estava sentado em cima da entrevista do treinador do Porto sobre o árbitro que irá apitar de forma tendenciosa o próximo jogo da sua equipa e a crise do meu Sporting que tarda em encontrar um novo rugido. Apesar do meu rabo estar relativamente mais quente, não consegui deixar de cobiçar o jornal do próximo. E, foi com um sentimento de alguma inveja, que pensei se a bunda do João não estaria mais quentinha. Ele tinha ao alcance da sua badana toda a efervescente actualidade política do nosso país . Começava pelo final da campanha eleitoral com Cavaco Silva a querer…(vejam bem)…”fazer voltar os tempos de credibilidade”. Eh,eh,eh. O tal que disse ter alertado repetidamente para a situação caótica do país. A primeira dama será testemunha das vezes que ele lhe sussurrou, ao deitar, repetidas vezes que o país tinha de mudar. Alegre denuncia “batota” do candidato da direita; Alegre um homem íntegro, sem batota ou contradição implícita; o homem que tanto insulta os amigos como lhes dá uns abraços e beijinhos na testa. “Dirijo-me à classe média e a todos aqueles que pagam os seus impostos” dizia Alegre na campanha alegre, tendo sido interrompido no momento em que se preparava para dizer “a essa classe média que o meu partido aniquilou, eu quero dizer que eu estou com vocês…e com o meu partido, e com todos os partidos que me quiserem…” . Quando lerem esta crónica já um dos dois terá a bunda quentinha sentada na poltrona do palácio de Belém sem ter recorrido ao aconchego de um jornal diário. Eu continuo aqui com alguma inveja por o meu amigo estar sentado em cima do Cavaco, do Alegre e daquele rapaz do PS, o Sérgio Pinto, muito elogiado por contrariar o voto do seu partido que tinha deliberado pela penalização a sério dos alunos violentos. Um rapaz de coragem por ir contra o aparelho partidário e decidir opor-se a uma das poucas decisões lúcidas deste governo. É preciso coragem e pontaria…eim? À falta de melhor tenho de me contentar em sentir algum calor com as notícias do desporto. Não posso continuar a invejar o potente calorífico arranjado pelo meu amigo, que até tem a possibilidade de aumento de potência com a notícia de que “Portugal aguenta juros de 7% por uns tempos” acompanhada pela fotografia de Teixeira dos Santos…como eu gostaria de colocar a bunda em cima daquilo…ou daquela aquisição de 2655 viaturas para o estado, no valor de 35 milhões de euros…(?)…alguns dos quais me retiraram este mês do ordenado.
O jogo da minha filha terminou e a cachopa lá conseguiu a enorme proeza de meter uma vez a bola dentro do cesto. No próximo encontro, já não me deixo enganar. Vou trocar o Diário de Notícias, pelo volumoso Expresso. Assim não corro qualquer risco de enregelamento das carnes traseiras, ao mesmo tempo, que me sento com firmeza em cima da nossa deprimente actualidade política.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Década "Dodot"


Nunca fui muito de fazer balanços de épocas. Também nunca me prendi ao conceito de década. No entanto, tenho de admitir, que às vezes dá jeito esse agrupamento dos 10 longos anos numa única década. Já os tipos que inventaram o sistema decimal pensaram nisso. Não precisa de se dizer o que fez ano a ano, podendo-se resumir as sensações que, de uma forma geral, se teve nessa década. Quando falamos por exemplo na década de 60, vem-nos à memória a loucura musical dos Beatles, o movimento hippie, a chegada do Homem à lua, a luta de Martin Luther King contra a segregação racial americana. Para nós portugueses, a década de 70 ficou fortemente marcada pelo fim das guerras Coloniais e a revolução de Abril. Poderíamos ir por aí fora encontrar traços marcantes de evolução em cada época, facilmente identificáveis. Acontece que, num exercício de memória resumida, decidi avançar um pouco mais e pôr-me a pensar sobre os aspectos relevantes desta última década que vivemos, a tal década 10. Para me facilitar a vida recorri ao método infalível das dietas milagrosas de emagrecimento do telemarketing do “Antes” e “Depois”. Basicamente a ideia seria pensar no que era o país há 10 anos atrás e no que se transformou até hoje. Pensei, pensei muito, voltei a pensar mais um bocadinho e consegui resumir a década, num termo também ele resumido:”Uma bela trampa”. Pensarão incrédulos alguns leitores, “Mas, mas,… trampa, não é aquilo que os bebés fazem à bruta na fralda quando são pequeninos?”. É isso mesmo, “aquela massa viscosa, acastanhada e nauseabunda, produzida por intestinos revoltados pelos leites com suplementos vitamínicos”. “Não achas que estás a ser demasiado rude? A década não foi assim tão acastanhada e malcheirosa; Olha! Foi nesta década que nasceu o filho do Ronaldo, por exemplo…ou que o Mourinho ganhou a 2ª Liga dos Campeões, foram bons acontecimentos…”. Para explicar melhor como cheguei à “Bela trampa”, teremos de passar um breve olhar pelos indicadores de desenvolvimento social e humano: Esta foi a década da impunidade na justiça, em que todos os arguidos se riem e se escondem debaixo de processos sem fim …à vista. Foi a década da multiplicação de ladrões e homicidas, que perceberam a anedótica segurança do país. Foi a década em que a escola passou de um local de ensino para um local de bandalheira e de degradação de valores educativos fundamentais. Foi a década do desemprego e do emprego trimestral …a recibos verdes. Foi a década das virtudes das novas tecnologias, da educação sexual com acesso gratuito a sites pornográficos, por miúdos que não sabiam o que era a vagina, mas ficaram a saber como se faz sexo anal acompanhado de gemidos “Isso,isso,isso”. Foi a década da pouca-vergonha política, da mentira gratuita, dos favores às claras. Foi a década das dívidas, que ninguém paga, nem quer saber quem paga. Foi a década de afogar os contribuintes em impostos, reduzir-lhes os salários e aumentar-lhes de forma obscena todos os bens de consumo. Foi a década da falta de respeito pelo próximo, onde qualquer miúdo pode chamar um idoso de “Ó velho!” sem levar dois tabefes na fronha. Como poderemos então resumir esta década senão como “Uma Bela Trampa”. Não é rude; é adequado. Até coloquei lá a “Bela” para amenizar o choque. Mais rude poderiam soar sinónimos como “Uma bela merda”, “uma bela defecação”, “uma bela bosta”, “Um belo esterco”. Achei que ficaria aqui melhor a trampa. Quer dizer a mesma coisa, ou seja, “Massa viscosa, acastanhada, com cheiro nauseabundo” , mas não soa tão mal. Pensando bem, deveria soar mal. Soar mesmo muito mal, para que se perceba a magnitude da trampa que representou esta década em termos sociais. Mas o que mais me incomoda, a par com o cheiro, é o facto dos responsáveis não admitirem com coragem os dejectos que produziram. O bebé, quando faz, admite logo; até faz um sorriso. Depois chora, para que lhe limpem o rabo. E deverá ser este, agora, o ponto de partida. A minha atitude é positiva, na esperança de que esta década que aí vem, se possa chamar de “Década Dodot”. Não a associada às fraldas, esse objecto que apenas serve para esconder a trampa e ser escondido sujo, dentro de uma lixeira. Refiro-me aos toalhetes Dodot, esses sim, têm o condão de limpar e perfumar o rabinho da criança, eliminando toda a porcaria produzida. Gostaria de ver alguém com essa capacidade Dodot, de limpar a trampa deixada durante esta malfadada década. Temo, no entanto, que, tal como os pais se acotovelam empurrando para o outro, a árdua tarefa de higiene “Hoje é a tua vez de limpar”, não apareça ninguém, que dê o corpo ao manifesto e, sem qualquer tipo de pudor, grite de uma vez por todas: “Passem-me os toalhetes! que eu vou limpar toda esta trampa!...

A fábrica dos Monstros

Estou em dúvida se devo contar ao meu filho, de uma vez por todas, que o Pai Natal não existe. Mas o miúdo faz sempre cartas com muitos desenhos para o senhor da barba branca. Custa-me dizer-lhe que o senhor afinal não existe. Sinto que estou a alimentar um falso mito, o que nesta época, triplica a magnitude do pecado. Mas o que é querem? Gosto de estimular esta capacidade das crianças acreditarem que existe um personagem, com o qual nunca falaram, e lhes oferece generosamente bonecos da playmobil. Já me esqueci do choro convulsivo da minha filha quando descobriu que o Pai Natal, afinal era o… Tio no Natal. Tivemos mais de uma hora a tentar explicar-lhe as virtudes da crença em figuras imaginárias,…”Mas todas as minhas amigas diziam que o Pai Natal não existia e eu quase andei à chapada para defender o senhor imaginário…para isto?!” dizia a rapariga soluçando. Tinha razão. Não se faz. Desta vez, fui um pouco mais contido na hora de contrapor quando o miúdo chegava a casa a dizer que os colegas lhe garantiam que o Pai Natal não existia. Utilizava a estratégia infalível: Nunca dizendo que sim; nunca dizendo que não. Desta vez o cachopo superou-se nas qualidades gráficas e fez uma carta que mais parecia uma serigrafia de um pintor reconhecido. Fiquei tão impressionado, que me apeteceu logo providenciar os pedidos aí expressos…De entre os 4 pedidos, sobressaía um que me deixava com a pulga atrás da orelha: Uma Fábrica de Monstros. Mas quem, no seu juízo perfeito, quer vender às criancinhas uma fábrica de monstros? Os Monstros foram criados, precisamente para afugentar as criancinhas do perigos do mundo. “Não fujas para muito longe que ainda aparece o Monstro da floresta!”, “não mergulhes nas barragens que ainda és comido pelo Monstro das profundezas!”, “não te afastes do pai que ainda és levado pelo Monstro da multidão!”. Agora, os cachopos para além de não terem medo de monstros, até os querem produzir. Eu acho que a culpa foi do Monstro das Bolachas, um monstro azul bonzinho e amaricado, amigo do Egas na Rua Sésamo. Monstro que se preze nunca come bolachas, quanto muito come criancinhas enquanto estas comem bolachas.
Felizmente, nunca cheguei a perceber o que era a fábrica de monstros…até ontem, na noite de Natal. O miúdo abriu o presente e lá vinha a fantasmagórica fábrica. Não fui eu o responsável! Quando muito o Pai Natal, ou a Tia, que faz sempre de Mãe Natal, resolvendo os desafios mais difíceis colocados pelos desenhos das crianças. E aquela unidade industrial era mesmo sofisticada: os monstros vinham embrionados em cápsulas, para serem injectados para dentro de umas formas que lhes davam o aspecto terrífico e gelatinoso. O objectivo depois de se fabricarem os monstros? Mandar os monstros à parede e rebentá-los com os pés. Um verdadeiro momento de fraternidade natalícia: Nascimento de Jesus, paz, amor e monstros desfeitos à pisadela nas alcatifas e tijoleiras da casa. O criador desta pedagógica brincadeira foi, decerto, traumatizado pelo monstro da floresta e nunca viu a Rua Sésamo. Decidiu vingar-se de forma gelatinosa dos monstros na noite de Natal. Aproveitou e vingou-se também nos pais. Inverteu a dinâmica da história. Agora seriam os pais aterrorizados pela chegada do Monstro das Alcatifas. “Oh pai, olha que se não te portas bem, esmago aqui o Monstro verde em cima do sofá novo do escritório!” … “O monstro verde, nããão!...” .
Quando o miúdo se preparava para iniciar a preparação dos Monstros, percebeu que a sofisticação precisava de 4 pilhas das grandes para dar vida à destruição gelatinosa. “Pai, podes ir outra vez à loja dos chineses comprar pilhas, como fizeste para o meu robot, aquele que utilizei durante 3 dias?”. Para o robot que fazia barulho ainda vá, agora para o Monstro que mudará a tonalidade do sofá novo, vai ter de esperar…quem sabe até ao próximo Natal…Isto se, entretanto, não me der um ataque de honestidade desmancha-prazeres e contar de uma vez por todas que o Pai Natal não existe. Quando muito, que existem uns Monstros maléficos, que dão trincadelas nas orelhas das crianças que sujam os sofás lá de casa…