Comecei o ano
a ouvir as sábias declarações do ministro da saúde sobre a saúde dos
portugueses. Dizia ele, que a única forma sustentável de reformar o Serviço
Nacional de Saúde passará pela vontade dos portugueses deixarem de estar…
doentes. A sua invulgar perspicácia descobriu que grande parte das doenças são
uma espécie de fetiche voluntário dos portadores. Percebeu que a maioria da malta
trocava de bom grado a plateia de um espectáculo musical pela sala de espera
das urgências, só para ocupar o tempo dos médicos e sentir o encosto do frio
estetoscópio sobre o mamilo esquerdo. Conseguiu
também encontrar pessoas que substituíam jantaradas cheias de gambas e vinho
verde com os amigos, por endoscopias gástricas e exames à próstata ; E o que
dizer de todos os indivíduos que em vez de viajarem para poder fotografar os
Alpes suíços, batem o pé para ficarem por cá a fotografar os meniscos numa daquelas máquinas de ressonâncias magnéticas,
que custam uma fortuna aos contribuintes?...e depois querem que o país ande
para a frente!?...
Apesar da
clarividência do ministro, fiquei com alguma pena dos novos empresários que se
preparavam para explorar esse fabuloso nicho de mercado das doenças por
encomenda. Já tinham uma carteira de
clientes significativa e procediam à fase da divulgação: “Deixe-se estar em
casa descansado, que da bicheza cuidamos nós”. “Está enfadado? Não sabe o que
fazer para ocupar o seu tempo livre? Temos a bicheza à sua medida! Basta
telefonar e depressa o levaremos para uma qualquer urgência perto de si!” A
oferta de bicheza ao cliente seria variada e iria ao encontro de diferentes
expectativas. Assim, para os pais de crianças pequenas, existiria uma vasta
gama de resfriados, gripes, gastroenterites leves, porque nestas idades, os
miúdos ainda não aguentam grandes bichezas. O Pai telefona para a CNBV
(Companhia Nacional da Bicheza Voluntária) e é só pedir : “Olhe faz favor,
gostaria de encomendar a propagação de uma virose ao meu filho; pode ser
acompanhada por excreções nasais, e alguma falta de ar; e, se quiserem uma
tosse seca…para que nós possamos passar a noite acordados e o possamos levar ao
hospital às 5 da manhã, estão à vontade!”.
Para adultos com algum arcaboiço, já se poderia explorar outro tipo de
bicheza. Aos saudosistas, poderiam dar a escolher entre uma tuberculose, um escorbuto
ou uma lepra, doenças que foram erradicadas há muitos anos atrás do nosso país,
mas com efeitos tão apelativos, serão sempre bem vindas; Os que apreciam outras
culturas tropicais poderiam optar por uma dose de Malária , de Dengue ou
Tripanossomíase Africana . Os mais radicais, os viciados em Adrenalina, que
gostam de chamar a morte por tu, entram de cabeça dentro das doenças
cancerígenas, aquelas cujos custos levam o Serviço Nacional de Saúde à penúria.
Este apelo que
o ministro faz para a malta se deixar dessa mania de querer ficar doente faz todo o sentido e
espero que se reproduza para outros ministérios. Assim, do ministério da
Educação, deveria sair o apelo, para os alunos deixarem de ser ignorantes. Onde
já se viu um aluno do 4º ano não saber nada da obra de José Saramago? No
berçário já deveria ter dentro da alcofa a obra de Nietzsche “Assim Falava
Zaratustra”, para ir dando uma olhadela entre duas mamadas. Quando chegasse ao
bibe Vermelho, já falaria fluentemente 4 línguas e tinha memorizado a grande
enciclopédia Universal. Chegando ao 1º
ano com conhecimentos do 12º ano, poupava-se numa carrada de professores, de
livros, de refeições, de transportes.
Assim é que o país se desenvolve.
No ministério
da Segurança social, implementariam a medida do “Não se deixe chegar a velho
que o sistema de reformas assim não aguenta.” Se o indivíduo tiver ideias de
entrar na terceira idade, o melhor é dar meia volta e voltar na direcção da
adolescência, ou, nessa impossibilidade, passar logo para o falecimento.
Gastava-se no funeral mas poupava-se muita massa nas prestações sociais, que
duram muitas vezes para além dos 20 anos…(os idosos são mesmo malandros). No ministério
da Agricultura, fazia-se um pedido especial ao Míldio das vinhas , ao
escaravelho da batata, ao caruncho do
feijão ou à Gafa da oliveira que deixassem em paz as pobres plantinhas. E
poderíamos ir por aí fora, de ministério em ministério, que rapidamente chegaríamos
a uma poupança considerável nos gastos públicos, podendo mesmo chegar para
pagar parte do buraco do BPN.
Ficou pois
claro, que eu estou consigo nesse esforço senhor ministro. Ainda hoje
contrariei essa vontade incontrolável de rumar até aos banquitos azuis do
centro de saúde e comecei a comer iogurtes com bifidus activo. Só lhe queria
pedir uma coisita sem importância: Acha que com este meu esforço para não ficar
doente ou não chegar à velhice, me pode dispensar a terça parte do meu ordenado
que me retém para impostos, saúde e hipotética aposentação? É que os iogurtes
com bifidus activo estão pela hora da morte…