Nos meus passeios matinais em época primaveril, a
inspeção periódica das coxas em busca de carraça invasora, é uma das rotinas
que cumpro de forma repetida. Num destes dias verifiquei que tinha 4 desses
espécimes subindo desenfreadamente perna acima agarrados às minhas pilosidades
com o mesmo vigor do Tarzan agarrado às
lianas em busca da sua Jane. Tratei de as despachar com a rudeza de 4
implacáveis dedadas em direção ao solo, sem qualquer tipo de compaixão. Aquilo
pesou-me na consciência. A carraça é um ser enigmático e, de alguma forma,
admirável. Vive toda a sua vida agarrada à erva daninha na esperança de que,
naquele inóspito terreno, passe por breves instantes uma coxa peluda para lhe
lançar a unha. No entanto, algumas morrem sem sentir a sensação prazerosa para qualquer parasita de sugar um pouco da hemoglobina alheia.
Percebia-se que a última carraça que despachei vinha feliz na sua ascensão. A
longa espera ao sol, ao vento, à chuva, tinha finalmente compensado. Dentro de
momentos já teria a dentição a trabalhar na epiderme do humano e a ganhar corpo
de atleta. A minha unha retirou-lhe esse prazer, qual tampa da miúda mais gira do
liceu na época da adolescência. Não conseguiu sequer consumar um breve momento
parasitário, uma ténue gota de sangue, levou logo uma nega em direção ao pó. Há quem
ache que a carraça um ser repugnante, eu acho-a persistente e crente. Permanece
impávida convencida que a sua hora chegará. E as que veem a sua hora chegar,
não perdem tempo com preliminares, vão logo à ação. Poder-se-á achar que a
carraça, uma vez instalada, poderia ser um pouco mais lúcida e permanecer escondida
no anonimato, em vez de ostentar a sua barriga proeminente de leucócitos
sugados a jorro e rapidamente se denunciar. Depois de uma espera tão longa e
penosa, queriam o quê? Que a bicha deglutisse o banquete ao ritmo deprimente de
um restaurante gourmet? Claro que iria encher o bandulho à fartazana. Não podemos
pedir discernimento a uma carraça que passou por tanto para ali chegar. Não sei porquê mas lembrei-me agora do
fabuloso ministro Cabrita, o tal da administração (e)interna. Se me lembrei por
causa dos milhares de ingleses que encheram o bandulho de cerveja nas ruas do
Porto e se divertiram a partir tudo por onde passavam, depois de uma longa
espera em abstinência anti-covid, pendurados
nas suas lianas britânicas? Não. Lembrei-me do ministro Cabrita por continuar
agarrado à coxa peluda do ministério depois de tanta patetice. Tenho de lhe tirar o chapéu. O Tipo é
persistente. Mas percebe-se. Depois de tanto tempo a vaguear nas ervas daninhas
dos corredores partidários em busca da tal coxa salvadora, eis que chegou a sua
oportunidade que tratou de a agarrar com unhas, dentes e alguma falta de senso.
Depois da primeira gafe das golas inflamáveis que pegavam fogo, poder-se-ia ter
mantido quietinho no seu canto sem encher muito o bandulho, para não darem por
ele, mas não. Atacou à bruta o banquete de alarvidades. Desde o caso do SEF, a gafe dos vacinados com
80 mil anos, passando pelos imigrantes ilegais de Odemira , os festejos
espampanantes dos adeptos do sporting e culmina agora na invasão “controlada”
de holligans ingleses nas ruas do porto a partir tudo o que é cadeira e paz
social. Mas atenção que a proteção civil
tomou medidas eficazes no combate ao caos. Enviou SMS a todas as pessoas para
colocarem máscara, manterem distância social e não beberem álcool. Só falhou,
porque os ingleses deixaram os telefones em Manchester. A Dona Júlia, vendedora
de toalhas na ribeira, depois de assistir a umas murraças e cadeiras voadoras
soltou um clarividente sotaque nortenho “Eu
estou admirada com isto! Então nesta multidão ninguém usa máscara? Até
colocaram ecrãs gigantes para ver a bola e depois queriam o quê?”. Ó dona Júlia, eu próprio também estou
admirado, não só com as palermices do Cabrita, como de todos os outros palermas
que dizem governar isto e não têm qualquer plano estratégico lúcido, que não
seja mandar vir mais barris de cerveja e deixar as golas a arder. Mas nem tudo é descontrolado. Na semana
passada, vi a notícia do controlo do caos de 5 miúdas estudantes de Erasmus que foram multadas na
hora por estarem a beber um copo de vinho num dos miradouros da capital. Firmeza nisso Cabrita! É Disso que o país
precisa, pulso firme!
Agora percebi como ainda ninguém conseguiu mandar
uma dedada ao Cabrita em direção ao pó e remetê-lo de novo à erva daninha. Simplesmente
chegámos ao ponto em que as múltiplas carraças se apoderaram do próprio e
passivo pedaço de coxa. Estão todas bem nutridas e firmemente seguras,
esperando que não apareça a tal febre da carraça que acabe com todo este
regabofe. Até lá, venha daí uma cerveja e uma cadeirinha para o que der e vier.