quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Aparições



Eu sei que não deveria escrever sobre a princesa de Gales. Mas escrevo porque já não tenho pachorra para ler mais nada escrito, nem ouvir mais nada falado, nem ver mais nenhuma imagem da rapariga. Estou a ser perseguido, diariamente, pela sombra da moça e começo a não gostar. Aliás nem ela deveria gostar de tanta barbaridade que se lê, ouve e vê sobre as suas preferências. Liguei o rádio do carro e…”faz hoje 10 anos que a princesa Diana…” apaguei o rádio. Comprei o jornal “Diana : Acidente ou assassinato?”. Mudei o campo de visão e lá estão elas, as revistais sociais repletas de descobertas e novas revelações: “os amores de Diana”; “Diana estava grávida mas não era do Dodi” ; “o príncipe era mau na cama e gostava de outra”; “perseguida pelos papparazi até à morte”; “traição do mordomo”. É de um tipo dar em doido. Mas o que é que eu tenho a ver com a princesa de Gales? O que é que nos interessa saber se era feliz ou triste ou triste e feliz; se comia bem ou mal ou mal e bem; se tinha amantes ou não tinha amantes ou os amantes é que a tinham a ela. Venera-se a divindade da princesa que morreu e lê-se em pulgas a última traição que cometeu, os desequilíbrios emocionais que tinha, a amargura em que vivia, as perseguições de que era alvo. Há qualquer coisa que não bate a bota com a perdi gota. A malta cria e alimenta a imagem da santa criatura, mas rejubila cada vez que dizem que a imaculada princesa até punha os palitos ao seu amado e esbelto príncipe. “Ó vizinha, coitadinha da Diana. Tão boa rapariga, ajudava os doentes, pobres e desfavorecido, e tinha de morrer assim de forma tão estúpida! Sabe….parece que ela e o príncipe, aquilo não andava bem; encornanços e coisas assim, sabe? Até dizem que engravidou de um tipo, mas gostava de outro que se pirou. Mas, ai, era tão linda, coitadinha que Deus a tenha!”.
Tenho de confessar a minha ignorância perante os feitos relevantes da princesa de Gales. Parece que deu visibilidade a causas humanitárias como a campanha contra as minas terrestres e a luta no combate à Sida. Mas quando ouço falar em causas humanitárias lembro-me dos médicos sem fronteiras e dos milhares de voluntários por esse mundo fora, que prescindem de mordomias reais para ajudar a tornar quotidianos de miséria um pouco menos miseráveis. E dez anos depois de muitos desses beneméritos morrerem, muitas das vezes atingidos por balas perdidas,… continua-se a dissecar a vida sexual da princesa do povo. A bem dizer, eles dispensariam essas relevantes coberturas jornalísticas sobre a tonalidade da sua roupa interior.
Agora estou mais interessado em dissecar outra Diana. A Diana Chaves, a nossa versão portuguesa de Diana, a mais solicitada pelos paparazzi nacionais. São anúncios de roupa interior, namoros com Cristiano Ronaldo, novelas bem produzidas , silicone nas mamas, tudo o que o povo gosta. É certo que ainda faltam umas infidelidades pelo meio e relatos de depressões, mas com o tempo lá inventarão qualquer coisa para a moça. Mas o que mais me surpreendeu foram as aparições (?). Não da Nossa Senhora de Fátima, mas da Diana nas discotecas. Até se diz que por cada aparição recebe um generoso Cachet. Só para aparecer; não fazer nada, nem servir à mesa, nem fazer malabarismo com bolas a arder, nem cantar umas musiquinhas, nem revelar segredos escaldantes, nada. Aparece a divindade, todos os homenzarrões se babam, para depois… toma lá a cheta e vai-te embora para outra discoteca, fazer mais uns milagres de veneração masculina.
Estou preocupado com a história da aparição, porque se a moda pega, haverá logo um espertalhão a dizer que viu uma aparição da Diana ,…a de Gales, por cima da casa dele, nos subúrbios de Paris, e que a entrada no seu quintal custará apenas 5 euros para o visitante, com desconto especial para crianças e idosos. Depois a malta pode acender umas velas ali entre o canteiro das rosas e a ameixieira, esperando que ela surja entre o nevoeiro e revele o seu segredo mais bem guardado: Qual o nome do imbecil que lhe fez o último retrato.

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