terça-feira, 11 de setembro de 2007

Quando os homens também choram



Eu vi os tipos agarrados a chorar e tive vontade de chorar. Berravam o hino, como se disso dependesse a sua vida e a do seu país. Viam-se as bocas bem abertas, as mãos bem firmes no pescoço do companheiro do lado e as vozes roucas embargadas pela emoção de ser português e estar ali, naquela hora a empunhar orgulhosamente o “Nobre povo nação valente” perante o mundo. Mas eu vi apenas o que me deixaram ver. Eram os nossos primeiros representantes na Taça do Mundo de Râguebi, que se preparavam para jogar. O jogo, esse, não o vi, simplesmente porque o canal público, para o qual todos contribuímos alarvemente, achou que a modalidade não tinha qualquer interesse público(?), bom pelo menos não tanto como a cobertura ininterrupta do caso Madelaine baseada em fontes próximas da polícia e do casal, o concurso Herança de Verão onde uns tipos gamam a massa dos outros ou aquela novela portuguesa representada por actores brasileiros. Continuava com a imagem daqueles matulões chorando convulsivamente e não pude deixar de me sentir orgulhoso ao ver o orgulho que os tipos tinham do país. Mas apesar do sinal de patriotismo, o país parece que não reparou neles. Afinal porque vale a pena reparar nuns tipos que vão lá só para perder por menos de 50 pontos com a Escócia? Afinal somos um país regido pela excelência, onde tudo é soberbo, onde apenas interessa a vitória, estamos habituados a sermos os primeiros em tudo. Será assim desprezível assistir à luta de jogadores para não perder por muitos; nós só conseguimos ver alguém a ganhar por muitos! Talvez por isso o quarto lugar no mundial de atletismo de Naide Gomes ser uma desilusão. “Então e a medalha miúda? Tu não consegues fazer melhor do que seres a quarta melhor do mundo? …que miséria…”. Mas voltemos ao Râguebi e à única selecção amadora entre as 20 melhores do mundo. Aos tipos que se reúnem depois do trabalho para se embrulhar na lama, que perdem fins de semana para jogar em estádios com 20 espectadores, que jogam lesionados para que se consiga chegar lá,…à taça do mundo, para que o país se pudesse orgulhar deles, do seu esforço, da sua dor e da sua voz a cantar o hino. Mas a busca da audiência desenfreada, fez com que o esforço destes atletas, passasse à margem do país. E perdeu-se a oportunidade de dar a conhecer o jogo de Râguebi, um jogo onde se cultiva o espírito de superação colectiva, onde existe um confronto duro mas leal, onde os jogadores não chamam nomes ao árbitro, onde o adversário vencido saúda no final o vencedor, um jogo em que cada metro de terreno é ganho através de muita luta, dor e dentes partidos. Será que ninguém vê utilidade pública aqui? Utilidade de educar para a superação, para o esforço, para o “ir à luta”. Não é isto que o país precisa de ver? Não. Porque a maior parte da malta encara o facto de sermos os últimos da Europa como uma sina, um facto inalterável. Aqueles matulões que choraram a ouvir o hino, apesar de saberem que têm poucas hipóteses de vencer, vão à luta, dão encontrões, agarram as pernas dos adversários, espetam-se de cabeça no meio da molhada.
Já eu tinha começado a escrever esta crónica e, por pura e inusitada coincidência, um amigo enviou-me em email, a comparação desse momento sublime e enérgico dos jogadores de râguebi gritando o hino, com o momento apático e flácido dos jogadores da selecção de futebol a entoarem entre dentes a nossa portuguesa. É uma constatação paradigmática: Os que têm toda a gente a torcer e a cantar com eles, os que são vistos na TV, os que ganham balúrdios para darem uns pontapés na chicha ou não cantam o hino ou cantam-no baixinho; aqueles que não ganham um chavo, que ninguém sabe o nome deles, que para os ver tem de se pagar a mensalidade da sport tv, os que apesar de saberem que vão levar umas cotoveladas e placagens, choram como crianças com orgulho e felicidade de serem portugueses.
Tenho de arranjar maneira de ver os restantes jogos da selecção de râguebi, para poder cantar com eles aos berros o hino de Portugal, mas sobretudo para poder chorar com eles, por saber que alguém não baixou os braços antes de conseguir colocar dentro de um rectângulo aquela bola oval.

2 comentários:

Anônimo disse...

Caro Miguel,
desculpa que te diga, mas estás enganado. Oh pá, acontece a todos, mais dia menos dia falhamos... e aconteceu agora. E porquê?, perguntas tu. Eu explico. A RTP transmite o futebol na RTP1, que tem muito interesse, transmite o atletismo na RTP2, que tem algum interesse e transmitiria o raguebi na RTP3 se... a tivesse. Além disso, transmitem em sinal aberto as modalidades que já toda a gente conhece e assim é que está bem. Já viste um portuga a gritar penalty num jogo de raguebi, lá no mundial? era uma barraca. Além disso, a SPORTV transmite e, como sabes, é a pagar, mas só transmitem jogos de qualidade, como o Benfica-Porto, o Porto-Sporting e o Sporting-Benfica, além do Chelsea, do Barcelona e... do Raguebi. è tudo por causa da qualidade.
Já reparaste que o Governo deu 443MILHÕES de euros à RTP, além dos milhões que nos levam da taxa de radiodifusão na factura da luz e da publicidade ilegal que emitem, porque se recebem taxas não deveriam dar publicidade...
Sabes que a SIC e a TVI não recebem nada do governo e dão lucro?
Um televisionado abraço!
Lúcio

cs disse...

Miguel,

Nem sempre consigo disponibilizar tempo para a “blogleitura”, mas quando calha fico contente por haver quem dê outras perspectivas dos acontecimentos, que quase sempre não coincidem com os média!!!
No caso da nossa selecção de Râguebi, o problema da transmissão dos jogos está no formato da bola! Por defeito uma bola tem um formato redondo/esférico e não um formato oval. Imagina a quantidade de reclamações dos telespectadores dos canais abertos (que não têm acesso à informação de um telespectador da televisão por cabo), sobre a qualidade da transmissão ou do defeito que o seu televisor plasma apresentava.
As mudanças de comportamentos e formatos têm de ser feitas com muito cuidado e com aviso prévio.
Um abraço,
Carlos Sousa