terça-feira, 4 de janeiro de 2011

A fábrica dos Monstros

Estou em dúvida se devo contar ao meu filho, de uma vez por todas, que o Pai Natal não existe. Mas o miúdo faz sempre cartas com muitos desenhos para o senhor da barba branca. Custa-me dizer-lhe que o senhor afinal não existe. Sinto que estou a alimentar um falso mito, o que nesta época, triplica a magnitude do pecado. Mas o que é querem? Gosto de estimular esta capacidade das crianças acreditarem que existe um personagem, com o qual nunca falaram, e lhes oferece generosamente bonecos da playmobil. Já me esqueci do choro convulsivo da minha filha quando descobriu que o Pai Natal, afinal era o… Tio no Natal. Tivemos mais de uma hora a tentar explicar-lhe as virtudes da crença em figuras imaginárias,…”Mas todas as minhas amigas diziam que o Pai Natal não existia e eu quase andei à chapada para defender o senhor imaginário…para isto?!” dizia a rapariga soluçando. Tinha razão. Não se faz. Desta vez, fui um pouco mais contido na hora de contrapor quando o miúdo chegava a casa a dizer que os colegas lhe garantiam que o Pai Natal não existia. Utilizava a estratégia infalível: Nunca dizendo que sim; nunca dizendo que não. Desta vez o cachopo superou-se nas qualidades gráficas e fez uma carta que mais parecia uma serigrafia de um pintor reconhecido. Fiquei tão impressionado, que me apeteceu logo providenciar os pedidos aí expressos…De entre os 4 pedidos, sobressaía um que me deixava com a pulga atrás da orelha: Uma Fábrica de Monstros. Mas quem, no seu juízo perfeito, quer vender às criancinhas uma fábrica de monstros? Os Monstros foram criados, precisamente para afugentar as criancinhas do perigos do mundo. “Não fujas para muito longe que ainda aparece o Monstro da floresta!”, “não mergulhes nas barragens que ainda és comido pelo Monstro das profundezas!”, “não te afastes do pai que ainda és levado pelo Monstro da multidão!”. Agora, os cachopos para além de não terem medo de monstros, até os querem produzir. Eu acho que a culpa foi do Monstro das Bolachas, um monstro azul bonzinho e amaricado, amigo do Egas na Rua Sésamo. Monstro que se preze nunca come bolachas, quanto muito come criancinhas enquanto estas comem bolachas.
Felizmente, nunca cheguei a perceber o que era a fábrica de monstros…até ontem, na noite de Natal. O miúdo abriu o presente e lá vinha a fantasmagórica fábrica. Não fui eu o responsável! Quando muito o Pai Natal, ou a Tia, que faz sempre de Mãe Natal, resolvendo os desafios mais difíceis colocados pelos desenhos das crianças. E aquela unidade industrial era mesmo sofisticada: os monstros vinham embrionados em cápsulas, para serem injectados para dentro de umas formas que lhes davam o aspecto terrífico e gelatinoso. O objectivo depois de se fabricarem os monstros? Mandar os monstros à parede e rebentá-los com os pés. Um verdadeiro momento de fraternidade natalícia: Nascimento de Jesus, paz, amor e monstros desfeitos à pisadela nas alcatifas e tijoleiras da casa. O criador desta pedagógica brincadeira foi, decerto, traumatizado pelo monstro da floresta e nunca viu a Rua Sésamo. Decidiu vingar-se de forma gelatinosa dos monstros na noite de Natal. Aproveitou e vingou-se também nos pais. Inverteu a dinâmica da história. Agora seriam os pais aterrorizados pela chegada do Monstro das Alcatifas. “Oh pai, olha que se não te portas bem, esmago aqui o Monstro verde em cima do sofá novo do escritório!” … “O monstro verde, nããão!...” .
Quando o miúdo se preparava para iniciar a preparação dos Monstros, percebeu que a sofisticação precisava de 4 pilhas das grandes para dar vida à destruição gelatinosa. “Pai, podes ir outra vez à loja dos chineses comprar pilhas, como fizeste para o meu robot, aquele que utilizei durante 3 dias?”. Para o robot que fazia barulho ainda vá, agora para o Monstro que mudará a tonalidade do sofá novo, vai ter de esperar…quem sabe até ao próximo Natal…Isto se, entretanto, não me der um ataque de honestidade desmancha-prazeres e contar de uma vez por todas que o Pai Natal não existe. Quando muito, que existem uns Monstros maléficos, que dão trincadelas nas orelhas das crianças que sujam os sofás lá de casa…

Nenhum comentário: